O Rock Dreams tinha disparado o melhor hambúrguer de São Paulo. Lembro de ir ao menos uma vez por semana comer um hambúrguer alto, coberto com queijo fundido. A casa funcionou de 1984 a 1994 em três locais diferentes. Eu frequentava a lanchonete na Brigadeiro Faria Lima, perto da Avenida Cidade Jardim, o terceiro e último endereço antes do fechamento. Quem comandava a casa era o mineiro de Leopoldina Roberto Peres. No início deste ano, Roberto, 59 anos, voltou a abrir uma hamburgueria em São Paulo, a Parsons Old Burger Shop & Full Bar, na mesma Faria Lima, só que perto da Hélio Pellegrino. A casa ficou aberta por apenas seis meses e já fechou as portas. “Não retorno mais nessa vida para São Paulo”, detona Roberto.

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Roberto Peres, ao lado da equipe na hamburgueria Parsons

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Interior da hamburgueria, que funcionou por apenas seis meses

Em 1973, Peres viajou a Inglaterra para estudar Hotelaria. Trabalhou em vários restaurantes, incluindo um chamado Parsons, que utilizava grelhas de carvão vegetal para assar as carnes. Em Londres, o empresário conheceu o comentarista de Fórmula 1 da Rede Globo, Reginaldo Leme, que seria seu futuro sócio na terceira fase da hamburgueria. Roberto desembarcou em São Paulo sete anos depois e decidiu montar seu próprio negócio. Em 1984, na Alameda Lorena, inaugurou o Rock Dreams. O nome e a decoração do lugar foram inspirados no livro Rock Dreams, do inglês Nik Cohn e do belga Guy Peelaert, que foi lançado no mesmo ano em que ele chegou na Inglaterra. “O livro é um registro fotográfico do rock nos anos 70″, conta Roberto, que se inspirou nas imagens para fazer a decoração da hamburgueria, que tinha 60 lugares.”Escolhi mesas e cadeiras metálicas em cores fortes, como rosa, vermelho e azul”, recorda-se. Por causa do crescimento do público, Roberto foi obrigado a buscar um espaço maior. Em 1988, ele abriu na Alameda Tietê o maior restaurante  da história do Rock Dreams. “Mantive os mesmos pratos e a mesma pegada de rock na decoração, mas precisava de um lugar maior”, conta Roberto. “Essa segunda casa tinha 200 lugares”.

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Primeira nota sobre a inauguração da Rock Dreams: Publicada na Folha de S. Paulo, em 27/04/1984. Segunda nota (à direita) publicada no mesmo jornal, em 14/12/1984, elogia a lanchonete

Foi na terceira e última fase da hamburgueria que começou a parceria com Reginaldo Leme. “Frequentava a lanchonete desde os tempos da Lorena”, conta o comentarista. “Na época, eu era sócio do bar Talento Jazz. A casa era um sucesso promocional, mas não dava lucro. Quando o lugar fechou, sugeri ao Roberto que levasse o Rock Dreams para lá”. Além de propor o novo endereço da lanchonete, Reginaldo convidou um colega de emissora, Ciro José, para participar do negócio. Em 1992, os sócios abriram a casa na Brigadeiro Faria Lima. O ambiente tinha 100 lugares, divididos em dois pisos. Eu já trabalhava na Veja S. Paulo naquela época e lembro que, no dia da reinauguração, o Rock Dreams teve que fechar porque os hambúrgueres tinham sido todos vendidos. Mas, aos poucos, o público foi minguando.

No ano de 1994, Roberto vendeu sua parte da lanchonete a Reginaldo Leme.  Mas a casa não resistiu por muito mais tempo. “O aluguel era muito caro e a Prefeitura tirou as vagas que existiam nos dois lados do canteiro central da Faria Lima. Ficamos sem estacionamento”.  A solução foi vender o lugar para um empresário que pretendia montar um restaurante japonês.

Nessa época, Roberto já tinha aberto a danceteria Chá-Chá-Chá.  A casa noturna fechou em 1996 e o mineiro montou no mesmo espaço o restaurante Alvorada, que também não emplacou. Então, Roberto decidiu voltar às origens: em 1998, abriu a Uncle Bob, na Rua Doutor Mário Ferraz. Lembro de ter ido uma única vez no Uncle Bob logo que soube que Roberto estava de volta ao negócio. Encontrei o restaurante quase vazio e achei que não iria emplacar.  A lanchonete fechou dois anos depois, no início dos anos 2000. Nesse mesmo ano, ele mudou-se para o Rio de Janeiro, onde o irmão, Omar Peres, é dono do tradicional restaurante La Fiorentina, em Copacabana. Sobre o retorno à São Paulo e o fechamento da lanchonete, ele conversou com o repórter Vinicius Custódio:

Como era o mercado do hambúrguer quando você abriu a sua primeira casa em São Paulo?
Era igual ao que é hoje. A Chapa, Chicohamburger e mesmo McDonald’s são praticamente as mesmas lanchonetes que continuam fazendo sucesso. Todas com o mesmo tipo de hambúrguer. Tentei desenvolver o conceito de um hambúrguer diferenciado, mas existe na cidade algo que se chama “memória gustativa”. O sabor de uma comida fica na memória e a pessoa sempre vai dar preferência a essa lembrança. É isso que acontece em São Paulo com os hambúrgueres feitos na chapa. Minha aposta é no char-broiler. O hambúrguer no char-broiler é como um bife feito no carvão vegetal, enquanto o da chapa é um bife na frigideira. No meu modo de preparo, sai o excesso de gordura e aumenta a textura da carne.

Sobre a questão da “memória gustativa”, Christian Germano, 45 anos, sócio-proprietário da lanchonete Achapa, não concorda com Roberto. “Conheço várias lanchonetes que não fazem hambúrguer na chapa e são sucesso em São Paulo. O próprio char-broiler é um modo de preparo que eu adoro”, afirma Christian. “Cada tipo de preparo deixa o hambúrguer com uma característica própria”. O empresário ainda conta que lhe ofereceram o ponto onde funcionava a Parsons. “Quando me apresentaram o negócio disseram: ‘Aqui funcionava uma lanchonete que tinha um ótimo hambúrguer’. Aí eu pensei, se o hambúrguer não era o problema e o negócio não deu certo, então eu não vou conseguir emplacar aqui”.

Como foi sua primeira saída de São Paulo?
Como falta cultura gastronômica de hambúrgueres na cidade, vendi minha parte do Rock Dreams para o Reginaldo Lemos e resolvi tentar outros negócios. Mas esses negócios não estavam se pagando. Em 2000, recebi o convite do meu irmão [Omar] para ir trabalhar com ele no Rio de Janeiro. Lá, cheguei a montar o Copa Café, que foi outro empreendimento interessante [a cafeteria foi inaugurada em 2005 e encerrou suas atividades seis anos depois]. Hoje, trabalho como gerente geral ao lado do Omar no restaurante La Fiorentina.

Nessa sua volta a São Paulo, você viu que muitas hamburguerias novas abriram as portas. Isso dificultou o seu negócio?
Passei 20 anos amassando pão em São Paulo para tentar criar um novo conceito sobre hambúrguer. Nos 10 anos em que estive fora, vi que surgiram invenções absurdas, que são impulsionadas principalmente pela mídia. No meu caso, soube que alguns críticos, como a jornalista Helena Galante, da Veja S.Paulo, não quiseram escrever sobre a Parsons. São Paulo gosta de modismos. Alguns milionários estão investindo em food trucks e todos os veículos falam sobre o assunto. Eu sei: se escreve sobre aquilo que mais vende, porém, não acredito que esse mercado de invenções vai continuar se sustentando por muito tempo.

Helena Galante, 27 anos, crítica gastronômica da Veja S. Paulo, explica que a política da revista é visitar um estabelecimento depois de um mês de sua inauguração. “Na minha primeira visita à Parsons, o hambúrguer veio frio, a carne não chegou no ponto certo, as batatas fritas estavam moles, o ketchup estava doce e o atendimento foi muito demorado”, enumera os problemas. Numa segunda visita, Helena conta que os erros eram os mesmos. “A revista não se recusa a escrever sobre nenhum lugar”, diz. “Porém, tem como regra não publicar locais que não indicaríamos para nossos leitores”. Helena explica que ligou para a assessoria da Parsons e contou que, por causa dos problemas, não iria escrever sobre a lanchonete. “Nunca conversei com o Roberto e não sei como a assessoria passou essa informação para ele”.

Por que Parsons e não Rock Dreams de novo?
Queria homenagear o restaurante inglês onde eu conheci a grelha de carvão vegetal e aprendi a fazer hambúrguer no char-broiler. Além disso, o dono do nome Rock Dreams ainda é o Reginaldo Leme. Cheguei até a conversar com ele para utilizar novamente o nome, mas não chegamos a um acordo a tempo da inauguração.

Tem algum plano para o futuro?
Hoje trabalho como gerente geral do restaurante do meu irmão. Quero continuar assim por um tempo, mas no futuro pretendo encontrar um sócio e abrir uma hamburgueria no Rio. Não retorno mais nessa vida para São Paulo.