Há um ano, o vereador Marco Aurélio Cunha (PSD) propôs um projeto de lei que cria  um novo tipo de Zona Azul em torno de locais destinados a eventos de qualquer natureza com público estimado acima de 5 mil pessoas. A “Zona Azul de Eventos” funcionaria desde duas horas antes do início previsto do evento até duas horas depois do término estimado, sendo permitido o uso de até três folhas simultaneamente, equivalentes a seis horas. Que fim levou esse projeto?

O projeto segue em tramitação e, em passos lentos, já passou pelo parecer da Comissão de Constituição, Justiça e Legislação Participativa e  também pela Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio-Ambiente. No momento está na Comissão de Administração Pública. Ontem, o vereador David Soares, do mesmo partido de Marco Aurélio, pediu vistas do projeto. Isso significa que ele terá, regimentalmente, duas sessões para devolvê-lo. E assim as coisas se arrastam. Depois disso, a lei antiflanelinha terá que passar pela Comissão de Finanças e Orçamento, antes de ser colocado em pauta em sessão plenária para ser discutido entre todos os vereadores e votado, em duas sessões diferentes. Essa, porém, é uma etapa muito mais incerta, já que a Câmara tem cerca de 1 mil propostas em tramitação e não se pode garantir o voto favorável dos vereadores.

“Não há uma data para o projeto ser colocado em pauta e nem garantias de que o projeto passará, mas talvez o mais importante seja a iniciativa, dando um exemplo de que se pode mudar essa situação”, diz o vereador.

A criação de uma lei divide-se em quatro fases: iniciativa, discussão, votação e sanção/veto. A iniciativa de propor um projeto de lei cabe, geralmente, ao prefeito e aos vereadores, mas pode ser feita por qualquer cidadão. Depois de protocolados, os projetos recebem um número. É por meio desse número que se pode acompanhar toda a tramitação.

Na fase seguinte, o Presidente da Câmara Municipal determina por quais Comissões de Mérito o Projeto de Lei deve ser apreciado. As Comissões opinam sobre o conteúdo do projeto, para avaliar se a proposta é positiva e se merece ser aprovada. Ao todo são sete Comissões permanentes, sendo que duas delas são obrigatórias para todos os Projetos de Lei: a de Constituição e Justiça (CCJ), que avalia a legalidade do projeto, e a de Finanças e Orçamento, que calcula o custo do projeto para o município e se ele não fere a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Depois de tramitar por todas as comissões às quais foi designado, o Projeto está pronto para entrar na pauta das votações, que é definida pelo Presidente e pelas lideranças partidárias. Se aprovado em primeira votação, o projeto deve aguardar pelo menos 48 horas para ir para a segunda e definitiva votação.

Caso seja novamente aprovado pelos vereadores em plenário, segue para a sanção do Prefeito. Cabe a ele sancionar ou vetar (parcialmente ou na íntegra) o Projeto de Lei. Se sancionado, é publicado no Diário Oficial e torna-se lei. Quando vetado, a Câmara pode arquivar o Projeto de Lei ou, se julgar procedente, derrubar o veto do Executivo por maioria absoluta e promulgar a lei.

“Muitas vezes o valor pago ao flanelinha é tão ou mais alto que o preço do ingresso, um absurdo que pode chegar até 100 reais em eventos como jogos da Libertadores”, afirma Marco Aurélio. Os paulistanos sabem bem o que ele está falando. “O flanelinha cobra o quanto quer e ainda ameaça causar dano ao veículo estacionado se não receber adiantado. Acredito que a existência de uma cobrança oficial, com valor moderado, intimidará esses guardadores e coibirá sua ação”.

Para que, no entanto, não haja qualquer dano ou furto (ou até uma dupla cobrança por parte dos flanelinhas), é preciso um esforço maior do Poder Público, tanto da Prefeitura, na forma da CET, Guarda Civil Metropolitana e agentes vistores, quanto do Estado, na forma da Polícia Civil e Militar. Segundo o vereador, são eles quem devem garantir a integridade dos veículos e prender os guardadores ilegais de carro. Mas nem todos os guardadores de carro estão sujeitos à prisão. A profissão é regularizada por lei.

A função de guardador de carro existe legalmente desde 1975. Já naquela época, os flanelinhas achacavam os motoristas, atuando, sobretudo, nas orlas das praias. Para resolver esse problema, o presidente Ernesto Geisel sancionou a lei que regularizava a profissão de “guardador e lavador autônomo de veículos automotores”.

Segundo a lei, para trabalhar como guardador de carro, a pessoa deve registrar-se em uma Delegacia Regional do Trabalho, com prova de identidade e bons antecedentes (sem antecedentes criminais, o que afasta muitos da legalidade), além de estar em dia com as obrigações eleitorais e militares. Atualmente no Estado de São Paulo, existem apenas 164 guardadores de carro registrados, a maioria em cidades do interior, organizados em associações e sindicatos. Um número ínfimo se comparado a quantidade de flanelinhas ilegais atuando hoje na cidade.

No exercício da profissão, cabe ao guardador apenas pedir algum valor em troca dos serviços prestado; ele não pode fixar qualquer quantia ou obrigar o motorista a pagar. É isso que difere o guardador de carro do flanelinha; o segundo costuma fixar preços altos e ameaçar danificar o carro caso o motorista não pague.

Atuação da polícia não é eficaz

A polícia pode prender um flanelinha sob a acusação de exercício ilegal da profissão e extorsão. Mas a atuação da polícia não é eficaz. O problema saiu do controle das autoridades por falta de fiscalização. Para mudar essa situação, foi criada a “Operação Flanelinha” em maio de 2012. A operação é realizada pela Polícia Civil, por meio do Departamento de Polícia e Proteção à Cidadania (DPPC), em parceria com a Polícia Militar e a CET.

A ação dos policiais usa investigadores à paisana, fingindo procurar uma vaga. Ao perceberem a aproximação do flanelinha, os policiais perguntam se há vaga livre. Mal o guardador de carros responde, eles anunciam sua prisão, por exercício ilegal da profissão.

Numa primeira fase, a ação tinha o objetivo de erradicar a prática irregular da profissão de guardador de carros durante jogos de futebol. A atuação se deu nos arredores de estádios, como o Morumbi e o Pacaembu. Durante esse período, 516 pessoas foram presas (194 com antecedentes criminais) durante 21 operações realizadas por policiais civis do DPPC e 11 ações promovidas pela Polícia Militar. Ainda é muito pouco.

(com colaboração de Marcos Oshima e fotos Daniel Teixeira e Clayton de Souza/Estadão)